
O corpo pesado desleixado sobre o teu, quente e úmido de suor. Uma gota de suor escorria pelo seu pescoço e caía à testa dela. Como uma lágrima. Sentia uma repulsa. Vontade de gritar, de unhar, de bater, qualquer coisa que pudesse tirar aquele corpo estranho de cima dela. Aquele peso insuportável. De nada adiantaria, ele estava cego, surdo e mudo para isso. Tinha apenas o seu desejo doentio de despejar seu prazer em alguém que para ele não importava quem. Uma vítima qualquer. Aquele gemido, aquela lâmpada acesa, aqueles pêlos nos braços, o corpo definido e tatuagem de uma águia nas costas. Ela olhou para o seu lado esquerdo onde tinha uma cortina plissada, com borboletas amarelas e fechou os olhos. Escuridão. Trancou a respiração até onde pôde para sufocar sua vida. Solidão. Então, pôde sentir o silêncio da madrugada pairando sobre os ruídos tenebrosos. Sossego. O corpo estranho levantou depois de um espasmo. Levantou-se e deixou sobre o criado mudo à prova do seu gozo. Ela voltou-se para o lado oposto à porta e às borboletas da cortina. As primeiras lágrimas. Primeiro de dor, depois de nojo, em seguida uma sensação de ter sido roubada e por último: ódio.
Não se recorda quantas vezes corpos estranhos à violaram. Sua memória apagou e posteriormente criou em sua imaginação a história que achava menos dolorida e aos poucos ela se tornou verdade. A primeira vez não tinha certeza do que aconteceria. Apenas algo inacabado e confuso. Um vulto de agonia, misto de dor e perda. A segunda vez foi como seu coração tivesse sido arrancado do peito e sido adaptado em seu estômago. Náuseas, medo, pânico, violência, morte e a terceira não existiu por sorte. Ela aprofundou uma lâmina em seu próprio punho para adormecer. Um sonífero para amenizar a dor e o sofrimento. Sua vida escorria pelo azulejo branco. Um pouco de vermelho nesse chão para colorir sua insatisfação. E assim, ela encontrou o esquecimento, fechando os olhos sem medo.
1 comentários:
Me lembrou algum trecho de livro relacionado algum drama vivido. A forma da escrita, principalmente. Digo, no sentindo estrutural, apesar de tamanha informação para apenas uma cena, não é confuso, porém instigante - ao passo de tentar saber o que acontece posterior ao que antes tenha lido. No sentido contextual, basicamente é uma marca sua a procura de uma escrita mais voltada ao suspense, drama, com uma pitada de terror, talvez. Sem exageros na escrita e de bastante clareza para o entendimento do leitor. Ainda quero vê você caminhar por outros caminhos e vê como você se sai, digo, uma crônica voltada para a comédia, talvez. Porém muito bom o texto.
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